quarta-feira, maio 13, 2009

Os universos (televisivos) da crítica

Temos, semanalmente, nos nossos pequenos ecrãs (pelo menos) três programas distintos sobre cinema que são incrivelmente parecidos. O formato é essencialmente composto pela seguinte receita: trailers das estreias recentes, previews de filmes que aí vêm, apresentação do box-office português e norte-americano, entrevistas com as estrelas dos filmes (e, uma vez por outra, com o realizador), uma ou outra featurette dos bastidores de uma grande-produção... e pouco mais.

O que falta a estes programas? Numa palavra: crítica. Não parece haver espaço para uma análise dos filmes que estreiam nas nossas salas e nas prateleiras de DVDs das lojas. A excepção à regra é o espaço de João Lopes no Cartaz da SIC Notícias, que peca sobretudo pela brevidade que advém de ser um segmento num programa mais generalista.

Poderíamos tentar explicar a ausência da crítica dos pequenos ecrãs com uma justificação de que qualquer discussão ou análise de um filme afugentaria as audiências por ser "demasiado aborrecida". Mas um exemplo emblemático de como se pode fazer um programa de televisão sobre cinema que é ao mesmo tempo inteligente, popular e, acima de tudo, portador de uma perspectiva crítica, é o célebre "At the Movies", um talk-show semanal de 30 minutos apresentado durante anos pelo duo de críticos Roger Ebert-Gene Siskel, tendo este último sido substituído por Richard Roeper após a sua morte.

O conceito do programa é de uma simplicidade invejável: junta-se dois críticos num cenário básico (duas cadeiras e uma parede onde são "projectadas" imagens), um deles faz uma breve sinopse do filme em questão enquanto imagens deste vão passando e, feita a descrição sumária da narrativa, inicia-se um diálogo entre os dois onde se alterna a análise inteligente e o confronto de pontos de vista não raramente antagónicos, sem nunca cair numa conversa de surdos. O resultado é um belo momento de televisão, entertaining e didáctico no melhor sentido das duas palavras.

Veja-se, por exemplo, o modo como Siskel e Ebert fazem a crítica de "O Padrinho III" de Francis Ford Coppola e discutem o tópico polémico da interpretação de Sofia Coppola como Mary Corleone:



Ou o modo como divergem sobre "Veludo Azul" de David Lynch:



E como analisam uma cena de "Halloween" de John Carpenter:



Resta-nos só questionar qual a razão para não termos nada parecido com este programa na nossa televisão. Nuno Markl e Rui Pedro Tendinha, há uns anos, fizeram uma espécie de "adaptação" deste formato no Curto-Circuito com o segmento Cine-Bolso e o mínimo que se pode dizer é que deixou saudades.

É indispensável consultar o site oficial do programa, que dispõe de um precioso arquivo de vídeo onde estão guardadas todas as críticas gravadas desde a sua primeira emissão em 1986.

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