domingo, julho 25, 2004

"O Despertar da Mente" - A memória dos afectos


Joel Barish (Jim Carrey), um homem de carácter introvertido, descobre que a sua excêntrica namorada Clementine (Kate Winslet) recorreu a uma estranha operação para apagar todas as memórias que tem dele. Joel descobre a companhia que fez a operação e pede, num misto de "vingança ciumenta" e incompreensão, para submeterem-no ao mesmo procedimento. Só que a operação levar-lhe-á a fazer uma viagem pelas suas memórias da sua vida com Clementine e, uma vez iniciado o processo de apagamento, Barish redescobre as razões porque se apaixonou pela rapariga e porque a sua relação falhou, tendo que derradeiramente fazer uma escolha definitiva: esquecer ou lembrar.

Só agora tive a oportunidade de ir ver "The Eternal Sunshine of the Spotless Mind - O Despertar da Mente" de Michel Gondry, dois meses depois da sua estreia, numa sessão única à meia-noite no Monumental (na mesma sala que, habitualmente, está a projectar o Shrek 2). E devo dizer que se o Verão tem andado a justificar a sua alcunha de "silly season", a permanencia de filmes como este em cartaz é de nos deixar um pleno sorriso na cara.


O argumento de Charlie Kaufman (autor dos scripts de "Queres Ser John Malkovich?" e "Inadaptado") é, mais uma vez, absolutamente fabuloso. O seu talento de compor personagens fantásticas em situações extraordinárias mantém-se intacto, bem como a sua capacidade de jogar com (e contra) as convenções tradicionais da escrita de argumento de modo a tornar toda a história mais interessante. Isto porque o filme, abordando o tema da memória e das nossas recordações afectivas (um tópico que certamente faria a delícia de Alain Resnais, cujo "Hiroshima, meu Amor" parece ter influenciado a história aqui e ali), está contruído como se ele próprio se tratasse de um conjunto de memórias erráticas que caminha para a sua progressiva clarificação. Constroi-se como um puzzle, mas vive-se (e sente-se) com uma intensidade rara. É uma das histórias de amor (ou sobre o amor) mais sincera e genuinamente românticas que o ecrã nos deu nos últimos tempos.

Mas se é verdade que o argumento é um elemento determinante, não podemos esquecer (injustamente) a contribuição do realizador Michel Gondry, da directora de fotografia Ellen Kuras e do montadora Valdís Óskarsdóttir para o belo todo que é este filme. O primeiro porque, ao contrário de que muitos têm especulado, usa inteligentemente a sua herança de realizador de video-clips para dar ao filme o seu "quê" de fantástico e surreal que necessita, sobretudo nas sequências passadas na memória de Barish, onde os efeitos especiais que sugerem o "apagamento" das recordações revelam-se um prodígio que, ao contrário de muito do que se vê no cinema actual, contribui para a narrativa em vez de ser simplesmente um mero fogo de artifício visual. A segunda porque a imagem tem um papel fulcral raramente visto, com a câmara a usar o foco e o desfoco para sugerir o estado da memória de Barish; e por fim a montagem que, talvez mais do que tudo, constroi o ambiente confuso e perdido da mente de Barish, funcionando com a precisão de um relógio. E há, claro, as interpretações dos actores...


...e que interpretações! Jim Carrey, de novo, mostra que é muito mais do que um actor de caretas, conferindo à sua personagem uma complexidade dramática que assenta muito mais nos pequenos pormenores de comportamento do que em expressões corporais exageradas. São poucos os actores que conseguiriam fazer este papel com a mesma entrega e seriedade de Carrey. Kate Winslet, que parece determinada a mostrar que tem uma gigantesca versatilidade e que é muito mais do que a "Titanic Girl", está deslumbrante do princípio ao fim num papel que poderia facilmente cair na caricatura mas que, graças ao soberbo trabalho da actriz britânica, consegue ser profunda. E nos secundários há que destacar a energia de Kirsten Dunst, a sobriedade de Tom Wilkinson, a surpreendente timidez de Elijah Wood e a solidez de Mark Ruffalo.

(Spoiler Alert) Incrivelmente, um dos elementos que parece destoar é o plano final do filme. Porque não acabou o filme com aquele (lindo) diálogo entre Winslet e Carrey? De onde veio a necessidade de fechar o filme com um plano de neve que nos deixa (literalmente!) ao frio? (Spoiler End)

Mas para dizer verdade, pouco interessa. Não é certamente por este pequeno defeito que o filme será recordado... 

O Despertar da Mente (Eternal Sunshine of the Spotless Mind). Drama. 2004, EUA.
Realizador: Michel Gondry
Argumento: Charlie Kaufman
Elenco: Jim Carrey, Kate Winslet, Kirsten Dunst, Mark Ruffalo, Elijah Wood, Tom Wilkinson
Produção: Anthony Bregman & Steve Golin
Dir. de Fotografia: Ellen Kuras
Música: Jon Brion
Montagem: Valdís Óskarsdóttir
Cor, 108 mins.
Tradução: Fátima Chinita

Site oficial: http://www.eternalsunshine.com/

3 comentários:

Anónimo disse...

Fico contente por teres gostado do filme, porque eu acho que foi dos melhores filmes que vi este ano ( axo que ate já te tinha dito). Mas deixa que te diga algo em discórdia contigo, eu concordo absolutamente com aquele plano final, porque repara, nesse plano vês eles dois distantes a brincar na neve e com o plano a repetir várias vezes, como se já se tivesse a antever o ciclo viciosso daquela relação ( apagar memória, voltar a conhecerem-se, etc.) Para além disso, a neve e o gelo está directamente ligado co a memória ( congelamento de experiências ou recalcamento e esquecimento e etc...)
Eu axo que esse plano final está muito bem, assim como o filme que é dos poucos filmes que tenho visto que me dá garra para fazer Cinema!
Samuel "Shandy" Horta

Ricardo Gonçalves disse...

Olá Samuel!

Antes do mais, muito obrigado por teres visitado o blog e por teres comentado! Desculpa só ter respondido tão tarde, mas por vezes o tempo (mesmo em época de férias) é tramado...

Percebo o que queres dizer acerca daquele plano, tem realmente a sua lógica, mas acho que fechar o filme daquela maneira com um plano um tanto "frio" (pelo menos para mim) pareceu-me um pouco desajustado. Mas, como já aludi no texto, não acho que seja esse pormenor que vá deitar abaixo o que de resto é um filme excepcional!

E concordo contigo: um filme destes, realmente, dá vontade de fazer cinema.

Anónimo disse...

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